“Ler e escrever não são coisas diferentes, mas as duas partes da mesma coisa” Álvaro Magalhães, mais de 40 anos a criar histórias

Num mergulho cativante pelo imaginário infantil, Álvaro revela sua trajetória única como escritor, inicialmente destinado aos adultos, até descobrir, ao escrever para sua filha, uma paixão que lhe rendeu prêmios e uma legião de leitores juvenis. Com uma habilidade notável em transformar temas complexos em narrativas acessíveis, o autor compartilha seu segredo para a criatividade desenfreada e desvenda o processo misterioso que o leva a criar mundos que fascinam não apenas as crianças, mas também os pais e educadores.

Nesta entrevista, Álvaro não apenas revela o fascinante universo por trás de suas histórias, mas também deixa uma mensagem calorosa aos jovens leitores e aspirantes a escritores, enfatizando a importância mágica da leitura.

Álvaro, como se deu conta de que queria escrever para crianças? O que mais o atrai nesse público?

No princípio, só queria escrever para adultos. E foi o que fiz. Só comecei a escrever para a minha filha, quando ela tinha seis anos, e descobri essa vocação, pois todos os meus originais de livros para crianças ganharam prémios. Nunca mais deixei de escrever para crianças e jovens. Quando a minha filha era adolescente, escrevi uma coleção de aventuras de jovens que teve milhões de leitores e foi uma série de televisão. Chamava-se «Triângulo Jota». Os leitores dessa coleção têm agora cerca de 40 anos e alguns já têm filhos que também lêem outros meus livros.

O que mais me atrai nos leitores jovens é a curiosidade e o entusiasmo com que lêem e vivem as histórias que lhes envio.

Venceu vários prémios ao longo da sua carreira. Como se sente ao ser reconhecido desta forma pela sua escrita para crianças?

O reconhecimento é importante, para nos estimular e recompensar pelo trabalho, dá-nos alento, são uma compensação para os sacrifícios que a escrita exige.

As suas histórias são repletas de criatividade. Como consegue ter tantas ideias para os seus livros? Qual é o seu segredo?

Se tivesse um segredo, contava-o. Mas não existe. Acontece que inventar é em mim uma função natural. Escrevo como respiro, naturalmente. Por isso, estou sempre em estado de inventar, de criar. Se não o fizer, sinto-me desconfortável. Logo, para mim é fácil e, sobretudo, natural.

Muitos dos seus livros abordam temas complexos como a amizade e a família. Como consegue tornar esses temas acessíveis e interessantes para as crianças?

A literatura que faço para os mais novos trata qualquer tema que faça parte da vida das pessoas, como esses, e outros. Simplesmente, há alguns temas que pedem tratamento mais delicado e cuidadosos. Mas não tenho temas tabus na minha escrita para os mais novos. O que eles encontram na sua vida, também encontram nos meus livros.

Sabemos que é um autor muito apreciado pelos pais e educadores. Como vê o papel da literatura infantil na educação das crianças?

Nos tempos que correm, ler é um pilar fundamental da educação e da formação de qualquer jovem, mais importante do que nunca. Além de lhes proporcionar a alegria de uma outra vida, dá-lhes grandes competências, que serão muito úteis na sua vida futura, e ajuda-os a compreender o mundo em que vivem e a inserirem-se nele.

Cada um dos seus livros tem a sua própria mensagem e lição. Como escolhe os temas e os tópicos para cada história?

Procuro sempre criar histórias que prendam o leitor e o façam mergulhar com prazer nessas histórias. Essa é a primeira regra, criar um clima, capturar o leitor, mas tento também que a história atravesse ou exponha aspetos importantes da vida.

Pode partilhar algumas curiosidades sobre o processo de escrita dos seus livros? Como começa a criar uma nova história?

À medida que as ideias surgem, aponto-as num caderno e só começo a escrever a história no computador quando tenho um caderno cheio de ideias  uma estrutura feita. Não posso dizer mais sobre esta parte do processo, pois ela é misteriosa. Segue-se outra fase do trabalho, que é das descrições e dos diálogos, que é uma fase muito trabalhosa, para mim, pois precisa de muitas reescritas e revisões. Escrever é essencialmente reescrever.

Como a pedagogia e a psicologia entram na equação quando escreve para crianças? Há alguma abordagem específica que segue?

Há muitos livros para crianças que têm um cariz pedagógico: ensinam coisas, da história ás boas maneiras. Mas isso não acontece com os meus livros. Penso que é um desperdício usar a literatura para ensinar, embora aprender e ensinar sejam coisas importantes. A literatura tem uma função mágica e imaginária e é apenas nessa função que eu a uso.

Já recebeu algum feedback especial de leitores jovens que tenha tocado o seu coração? Alguma história ou experiência que queira partilhar?

Tive sempre a sorte de ter muitos leitores. É isso que faz com que eu escreva sem descanso há mais de quarenta anos. Muitos me escrevem, outros me procuram e querem conhecer pessoalmente. Recebi muitos em casa e fiz amizades duradouras. Estou sempre disponível para eles. Para mim, não há nada mais importante do que os meu leitores. Sem eles, sem a sua leitura, o que seria dos meus livros? Nada. Um livro é um conjunto de palavras impressas, de símbolos mortos, mas chega o leitor e abre o livro e aquelas palavras animam-se e ganham vida. Graças a eles.

Para os jovens escritores que sonham em seguir os seus passos, que conselho lhes daria para começarem a escrever para crianças?

Já me fizeram esta pergunta mais vezes, Da última vez, respondi mais ou menos assim:  primeiro é preciso ler.  Aliás, ler e escrever não são coisas diferentes, mas as duas partes da mesma coisa.

Depois, há que tratar de arranjar um gato. Tê-lo por perto ajuda muito.  Finalmente, pode-se experimentar a escrita e aprender com ela. Não há outro professor, não há outra escola. Aprende-se a escrever escrevendo. Mas convém ter sempre presente que escrever é um trabalho duro que exige talento, naturalmente, mas também perseverança, paciência e grande capacidade de trabalho

Uma mensagem para os leitores!

Queridos leitores e amigos. Parabéns por serem tão bons leitores e se interessarem por livros e escritores. Nunca desistam, por favor, nem quando crescerem e acharem que há coisa mais importantes para fazer. Claro que há coisas importantes para fazer, mas a leitura é uma delas. Ler, além do prazer e da alegria que causa, também faz muito por cada um de vós.

Álvaro Magalhães

Álvaro Magalhães nasceu no Porto, em 1951, e publicou o seu primeiro livro em 1982, celebrando, em 2022, 40 anos de vida literária. A sua obra para crianças e jovens, que integra poesia, conto, ficção e textos dramáticos, repartindo-se por mais de 120 títulos, caracteriza-se pela originalidade e invenção, quer na escolha dos temas quer no seu tratamento. Foi várias vezes premiado pela Associação Portuguesa de Escritores e pelo Ministério da Cultura. Em 2002, O limpa-palavras e outros poemas foi integrado na honour list do Prémio Hans Christian Andersen, em 2004, Hipopóptimos – Uma história de amor foi distinguido com…
Álvaro Magalhães nasceu no Porto, em 1951, e publicou o seu primeiro livro em 1982, celebrando, em 2022, 40 anos de vida literária. A sua obra para crianças e jovens, que integra poesia, conto, ficção e textos dramáticos, repartindo-se por mais de 120 títulos, caracteriza-se pela originalidade e invenção, quer na escolha dos temas quer no seu tratamento. Foi várias vezes premiado pela Associação Portuguesa de Escritores e pelo Ministério da Cultura. Em 2002, O limpa-palavras e outros poemas foi integrado na honour list do Prémio Hans Christian Andersen, em 2004, Hipopóptimos – Uma história de amor foi distinguido com…

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Fill out this field
Fill out this field
Por favor insira um endereço de email válido.
You need to agree with the terms to proceed